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Saúde mental na terceira idade

SAÚDE MENTAL NA TERCEIRA IDADE

Carlize Regina Ogg Nascimento – Psicóloga – CRP 08/1816

Aos 79 anos, em 02/10/2022, ao participar da maratona de Londres, Drauzio Varella, médico brasileiro e muito conhecido pelo seu trabalho divulgado na mídia, tornou-se o atleta mais longevo a ganhar a chamada “Six Star Medal”. Esta medalha é conferida aos corredores que completaram as seis maiores maratonas do mundo —Berlim, Tóquio, Nova York, Boston, Chicago e Londres.

Fernanda Montenegro (93 anos), Lima Duarte (92 anos), Ana Maria Braga (74 anos), Betty Faria (80 anos), Ary Fontoura (90 anos), são exemplos de que é possível levar uma vida saudável, produtiva, tanto física quanto psiquicamente. Contudo, é preciso um investimento subjetivo, que poderíamos chamar de desejo, e uma vontade de bem viver, fortes o bastante para superar qualquer uma das justificativas que o ser humano lança mão para evitar o esforço. A tarefa torna-se mais complexa na terceira idade em virtude da diminuição do vigor físico que leva junto uma parte da disposição de ânimo.

Não há como negar as modificações do corpo e da aparência, provocam um estranhamento da autoimagem, que Ferreira Gullar expressa com maestria.

O teu corpo muda
Independente de ti
não te pergunta
se deve engordar.
E até já tens medo
De olhar no espelho:
Lento como nuvem
o rosto que eras
vai virando outro.

A perda do cônjuge, de amigos e familiares empobrece a vida social do idoso, podendo acarretar um isolamento involuntário.

No plano social e político, o discurso vigente pinta o processo de envelhecimento com cores sombrias, como se nada de positivo pudesse ser encontrado nesta fase da vida.

Atualmente estamos assistindo a um movimento que, se tem se esforçado por mudanças, ainda está longe de contribuir efetivamente para uma modificação da maneira com que a sociedade encara a longevidade.

É muito comum que as pessoas idosas sofram discriminação, violência e segregação.

As políticas públicas começaram a acordar há apenas 20 anos para as necessidades das pessoas acima dos 60 anos e, com isso, vimos nascer o Estatuto do Idoso que assegura os direitos, até então ignorados, das pessoas idosas.

Diante deste panorama, como fica a saúde mental do idoso? Como lidar com adversidades em relação à condição física, à autoimagem, à depreciação social?

De que forma escapar de estados depressivos, da falta de interesse e motivação para buscar alternativas para uma vida satisfatória?

Ouço com frequência no consultório e na vida social, questões como: prá quê psicólogo a esta altura da vida?

Será que ainda tem jeito de mudar alguma coisa? Ainda dá tempo?

Acontece que o psiquismo continua lá, a identidade continua a mesma.

As marcas que constituíram a personalidade da pessoa continuam lá

O psiquismo não envelhece! (MUCIDA, 2009)

Contudo, o modo de encarar a vida, e a passagem do tempo, é particular de cada um e pode ser um grande aliado, ou o vilão da história.

A fragilidade orgânica pode provocar o medo de não conseguir realizar esta ou aquela tarefa, ou ainda de sair sozinho à rua, levando o idoso a uma dependência dos familiares.

É claro que a chegada da velhice assusta e pode trazer fantasmas, há muito esquecidos, que podem provocar angústia, sintomas depressivos, eventos psicossomáticos, pois o corpo e psiquismo são articulados entre si.

O trabalho psicoterapêutico pode proporcionar mudanças no modo de encarar a diminuição do vigor físico e das capacidades funcionais.

A partir desse trabalho de reelaboração subjetiva, o idoso torna-se capaz de reinventar o modo de realizar atividades; consegue reapropriar-se da autonomia, pode buscar uma vida social mais satisfatória, criar alternativas e descobrir desejos que até agora sequer haviam sido vislumbrados.

É possível que haja questões sobre o laço conjugal e a sexualidade que se queira abordar.

A chamada Síndrome do ninho vazio, caracterizada pela saída de casa dos filhos, também é motivo, frequente, de busca por um trabalho psicoterápico.

Há o idoso que deseja voltar a trabalhar, ou aquele que receia aposentar-se, embora deseje fazê-lo.

O resultado deste trabalho é uma revalorização da autoimagem e com ela uma potencialização da autoestima.

Enquanto isso, sem perceber, se está a aproveitar o tempo, bem precioso, que foi tão escasso enquanto corríamos atrás de riquezas outras, e que agora se coloca disponível para usufruirmos da melhor maneira que pudermos.

Finalizo com Raduan Nassar em Lavoura Arcaica,

Rico só é o homem que aprendeu piedoso e humilde a conviver com o tempo, aproximando-se dele com ternura. Não se rebelando contra o seu curso. Brindando antes com sabedoria para receber dele os favores e não sua ira. (NASSAR, 1975 apud MUCIDA, 2009)


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