Medicalização do sofrimento: a que ponto chegamos?
Na escola da vida, nas escolas médicas, no ensino fundamental, na internet, aprendemos tudo, menos o essencial: a lidar com o sofrimento.
Por isso, minha dica é: Permita-se! Exprima seus sentimentos!
O tempo cura as feridas, chorar alivia a dor. A saudade nunca passa, mas aprendemos a lidar com ela.
Bons amigos podem ser um grande alívio para os problemas. Não há explicação científica para os mistérios da vida. Portanto…
VIVA!!
Vivemos a Era da Tecnologia. Temos muita informação ao alcance de nossas mãos, e com extrema agilidade. O que precisamos, encontramos em nossos tablets e smartphones.
Nosso trabalho também foi facilitado por essa incorporação tecnológica, porém, ao mesmo tempo, essa rapidez com que as coisas acontecem em nosso mundo atual também gerou uma maior pressão: por resultados, por eficiência, por cumprimento de metas cada vez mais inatingíveis.
A evolução da sociedade criou um “inconsciente coletivo” que prima pela excelência em todos os aspectos.
Não basta ser bom, precisamos ser os melhores, em tudo. Caso contrário, surge uma sensação de fracasso, que nos persegue por toda a vida.
Hoje em dia, a individualidade é essencial.
Luta-se muito pelos direitos das minorias desfavorecidas, e muitos possuem inúmeros argumentos a favor de uma ou outra postura, seja ela política, econômica, jurídica ou social.
Somos “doutores” em qualquer assunto que resolvemos pesquisar no Google, independente da fonte.
Qual o problema disso?
Acabamos, nesse turbilhão de acontecimentos simultâneos, confundindo individualidade com individualismo, e prestando atenção apenas aos nosso próprios problemas, necessidades e direitos, sem abrir espaço ao outro.
As relações humanas estão, cada vez mais, limitadas às redes sociais.
No Japão, já existem aplicativos que simulam relacionamentos, tamanho é o medo de se envolver com o real, de se expor ao sofrimento.
A tecnologia funciona como uma “faca de dois gumes”: ela nos traz muitos avanços e conhecimentos, mas traz uma falsa ideia de perfeição, que acaba se estendendo para nossas vidas pessoais.
A Medicina atual encontra-se nesta interface, uma vez que, há mais de 100 anos, baseia-se na publicação do famoso Relatório Flexner, o qual, dentro do contexto da Revolução Industrial, de 1910, criou regras para as escolas médicas, “fatiando” o conhecimento, e, consequentemente o ser humano.
Podemos exemplificar isso facilmente, levando em consideração as inúmeras especialidades médicas que existem na atualidade.
Não venho, aqui, fazer juízo de valores, apenas desejo chamar a atenção dos leitores para as consequências deste processo: a mecanização do Homem.
Fomos transformados em máquinas, que necessitam produzir em capacidade máxima, e, caso apresentem algum “defeito”, necessitam “trocar peças”, ou resolver de forma puramente mecanicista.
Procura-se uma causa biológica para todos os problemas de saúde apresentados pelos indivíduos de nossa sociedade.
Qual o resultado disso?
A medicalização do sofrimento. Máquinas não pensam. Máquinas não sentem.
Sendo assim, uma vez máquina, eu não tenho o dinheiro de expressar minhas emoções, o que gera desconforto, sofrimento.
Caso não o expresse, eu o somatizo, apresentando sintomas físicos, porém com origem psíquica.
O que isso significa?
Isso quer dizer que há sofrimentos que não estarão estampados num resultado de exame laboratorial ou de imagem.
Uma ressonância magnética de crânio não explica o motivo de nossos medos, não justifica a falta de obediência de nossos filhos.
O ser humano é muito mais complexo do que isso. Ele sente, chora, sofre.
E isso é absolutamente normal. Porque não é natural não chorarmos em velórios; é comum lamentarmos a perda de um ente querido.
A pressão sobe, o coração acelera, desmaios podem acontecer. E não é preciso nenhuma droga para combater isso! Afinal, somos feitos de carne e osso, e não pedra. Ninguém é de ferro!
Mas, na escola da vida, nas escolas médicas, no ensino fundamental, na internet, aprendemos tudo, menos o essencial: a lidar com o sofrimento.
Por isso, minha dica é: Permita-se! Exprima seus sentimentos!
O tempo cura as feridas, chorar alivia a dor. A saudade nunca passa, mas aprendemos a lidar com ela.
Bons amigos podem ser um grande alívio para os problemas
Não há explicação científica para os mistérios da vida. Portanto…
VIVA!!
Dra Andréia Conte
Médica de Família
CRM-PR 28965
Ambulatório Judicemed